quinta-feira, 22 de maio de 2014

Sendo Assim

Eram duas e meia da manhã, ouviu-se o barulho da porta se abrir e passos descalços no chão frio, o destravar da fechadura do portão ecoou pelo silêncio da madrugada fria, a neblina impedia que Luís visse o final da rua pela qual seguia.
      Ele caminhava em passos largos ensaiando a futura conversa:
      _Oi, demorei muito hoje? Trouxe miojo cru pra gente comer, você gosta?
      O caminho da sua casa até o Hospital variava de cinco a seis minutos se fosse andando que nem ele, ao dobrar uma esquina ele se deparou com um gato e um cachorro deitados juntos, tentando se aquecer da primeira madrugada de inverno. Ele passou e recomendou:
      _As pessoas não podem saber que vocês são amigos.
      Ao atravessar uma avenida que estava vazia ele avistou uma pessoa com roupa hospitalar branca, abraçando as árvores do parque e desejando boa noite. Ele se aproximou e chamou pelo seu nome:
      _João?
      João ainda abraçado olhou para Luís e fez questão de apresentar as árvores para seu amigo.
      _Oi Luís, eu estava aqui me despedindo dos moradores aqui do parque, essas são Doriana e Bony, e aquele é o César.
      _Muito prazer pessoal - cumprimentou Luís, acenando para as árvores.
      _Já vou, amanhã vejo vocês - despediu-se João.
      Os dois aventureiros da noite seguiram em direção a um grande gramado que ficava nos fundos do Hospital e se acomodaram.
      _João é impressão minha mas quando eu cheguei eu percebi que você estava com o pijama do Hospital?
      _Tava, eu me atrasei hoje e esqueci de trocar. Mas eu trouxe maracujá pra gente e você trouxe o que?
      _Miojo cru, você gosta?
      _Só o de feijão - respondeu João tirando dois maracujás de dentro de uma sacola.
      Os dois amigos conversaram por longas horas, sem sequer reclamarem do frio, pois estavam aproveitando aquele momento juntos. O dia foi amanhecendo e Luís levantando-se disse:
      _Já vou indo meu amigo, dá cá um abraço.
      Ao tentar se levantar, João se sentiu fraco e regurgitou tudo aquilo que fora comido.
      _Teremos que arrumar um outro lugar para sentar amanhã - recomendou João.
      _Não tem problema esse gramado é grande.
      Eles se abraçaram por cerca de uns quinze segundos e cada um seguiu para um lado, mas olhando para trás Luís perguntou:
      _Você volta amanhã?
      E João respondeu:
      _Se o câncer não me matar até lá.

Felizes

      O quarto de Ana se mantinha em silêncio até ela e seu namorado Samuel chegarem aos beijos e amassos. Deitaram sobre a cama que ainda estava com cobertas desdobradas, Samuel que estava por cima de Ana começou a descer beijando seu pescoço e ao mesmo tempo sentindo o perfume que ela havia passado para ir à escola, os dois saciavam o desejo sexual juvenil um pelo outro.
      Ao trocarem de posição Ana levantou-se, pegou uma fita de áudio na gaveta, etiquetada "forever" e colocou em seu toca-fitas que estava sobre a cômoda.
      _Você gosta de música? - perguntou Ana enquanto desabotoava sua camisa.
      Samuel balançou sua cabeça afirmamente.
      _Então vem dançar comigo - convidou Ana estendendo o braço à Samuel.
      O casal dançava como se já tivesse ensaiado a meses com passos sensuais e um grande envolvimento, com a evolução das carícias no decorrer da dança os dois começaram a se despir e ficando corpo a corpo Samuel beijou lentamente os lábios de Ana sancionando o amor correspondido.
      _Eu quero fazer amor com você - sussurrou Ana olhando fixamente para os olhos de Samuel.
      _E eu quero te proporcionar esse amor - completou Samuel levando-a novamente para a cama.
      Os dois começaram a ter uma relação sexual diferente das atuais, pois mesmo o sexo envolvendo o desejo físico também existia amor envolvido.
      Samuel penetrava Ana na posição conhecida como "papai e mamãe", por um momento ele não escutou mais Ana gemer e resolveu tentar beijar sua boca, e viu que ela estava de olhos fechados e sem respirar. Ele levantou desesperadamente da cama chamando pelo nome de Ana e checando o pulso de sua amada.
      Anabelle uma garota jovem e apaixonada dos anos noventa, faleceu nos braços do seu amor, mas que mesmo assim morreu feliz.

Protegido

As crianças chegaram no parque e largaram seus calçados ao lado de uma árvore, e os pais preocupados recolheram-os e advertiram:
     _Tomem cuidado.
     O verão tinha acabado de começar, o sol fazia aquilo que já era experiente: brilhava, a grama se intitulava verde e os ventos balançavam as folhas das grandes árvores.
     Estela, mãe de Gabriel, tinha acabado de chegar, depositou sua bolsa em cima do banco de madeira e sentou-se; abriu sua bolsa que continha um protetor solar fator cinquenta, seu celular e alguns trocados para o sorvete. Gabriel de cinco anos, já havia corrido para o playground, afim de não perder tempo enquanto estivesse no parque.
     _Gabriel, vem passar o protetor! - chamou Estela.
     O menino deu sua última descida no escorregador e correu em direção à sua mãe.
     _Mas pra quê protetor mãe?
     _Para você ficar protegido do sol, e não ficar queimado - respondeu a mãe enquanto passava o produto nos braços do filho.
     _Protegido? A tia da igreja me falou que se eu orasse, Deus iria me proteger de tudo.
     _Sim filho, Deus ensinou ao homem a receita desse protetor, para a gente passar na pele, e assim ele ta nos protegendo também - respondeu a mãe, terminando de passar no rosto do filho.
     Ao terminar de passar o produto, o menino correu novamente para o brinquedo sem sequer prestar atenção na resposta que sua mãe lhe dera. Estela guardou o produto dentro da bolsa e pegou seu celular, discou o número de seu novo namorado e começou a conversar sobre o que mais gostava de cozinhar.
     Aquela tarde de domingo, parecia tranquila, mães conversavam em sombras frescas, crianças brincavam no parque colorido recém reformado pela prefeitura e o senhor do sorvete chegava com seu carrinho e uma música infantil, a não ser por um carro que vinha em alta velocidade em uma pista que ficava de frente para o parque.
     O motorista que vinha dirigindo esse carro estava embriagado e acelerou ao invés de frear, acertando em cheio o escorregador. Estela vendo aquilo jogou o celular no chão e correu em direção ao ocorrido, e chamou pelo nome do seu filho:
     O menino saiu de baixo do carro com alguns arranhões na testa e respondeu:
     _O protetor me protegeu mãe.